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Quem faz o Brasil?

jun
2012
Por Raquel Diniz Ezequiel*

De forma direta, poderíamos responder que todos nós fazemos o Brasil. E de fato, é assim que o é. No entanto, queria ser mais específica e falar de um Brasil que vai se transformando no dia a dia, dentro das pequenas comunidades em cada canto desta nação, a partir de iniciativas de guerreiros que após dias de desassossego, acreditam que podem ir além e concentram energias na construção de um cenário melhor.

Quero falar dessa revolução que por vezes é silenciosa, distante das grandes mídias, longe dos recursos financeiros volumosos (milhões que rolam por aí) e do acesso às informações e formações que poderiam facilitar-lhes o caminho.

A despeito de todos os desafios sociais, econômicos e ambientais que bem conhecemos e/ou estamos tomando conhecimento (sim porque “novas” demandas surgem a cada dia), há muitas pessoas e organizações da sociedade civil que não sucumbem, que lutam diariamente pela vida de muitos brasileiros.  Logicamente, não há nenhuma novidade nisso, até porque é algo que ocorre há anos, mas é chegada a hora de olharmos para essa parte da nossa história com contemplação e dedicação. É hora de ouvirmos e aprendermos com quem está na ponta.

Há um ano e meio a convite da BrazilFoundation (www.brazilfoundation.org) passei a coordenar o Programa de Formação de gestores de organizações não governamentais, parceiros da própria fundação e do Instituto HSBC para Sustentabilidade. Os parceiros recebem além do aporte financeiro, apoio à implementação dos projetos por meio de encontros de formação e monitoramento das ações.

O programa, há mais de 7 anos, tem trazido a possibilidade de um aprendizado profundo sobre os desafios e avanços do terceiro setor. A maioria das instituições parceiras é de pequeno e médio porte (em termos financeiros e de equipe), atuam no interior do país ou nas periferias, respondendo a um diverso mosaico de causas e públicos (pescadores, índios, pessoas com deficiência, vítimas de violência, prostitutas, etc). Muitas organizações estão recebendo apoio externo pela primeira vez.

Escutar suas histórias é mergulhar num Brasil de verdade, que se desvela a cada solução encontrada, metodologia criada e vida transformada. Realidade tão distante e oculta para quem vive nos grandes centros urbanos, assoberbados pelo trabalho, encastelados pela ansiedade do consumo desenfreado, estancados no trânsito e que só ouve falar do que se passa do “outro lado” pelos problemas ou pelas orgias da corrupção que envolvem uma pequena parte de ongs, que nada têm a ver com quem trabalha seriamente.

Vivenciar estes encontros tem sido como aprender a ser gente, a ser brasileira. É a construção de um caminho de fé, de crença de que há outras maneiras de estar no mundo e de se relacionar. Seja por meio do desenvolvimento de sementes mais resistentes à seca, por um sistema rotativo de produção de farinha, da multiplicação de uma metodologia de acesso de jovens ao ensino superior ou pela qualificação profissional de cegos ou ainda por meio do ensino de música, e por meio tantas outras iniciativas, as transformações são visíveis.

São Jordânias, Valdivinos, Josés, Marias, Edcarlos, Antônias, Vivians, Leandros, Lucianos, Manoels, Aurenis, Joãos…Pessoas que escutam música onde não há, imaginam estudo onde não existe escola, lutam por saúde onde há preconceito, cuidam quando não foram cuidados. Estes são os verdadeiros “fazedores” do Brasil.

Durante o encontro sobre Empreendedorismo e Sustentabilidade, promovido pelo “O Instituto”, no dia 22 de maio no Rio de Janeiro, Marcus Faustini, do Agência de Redes para Juventude, afirmou que temos falado muito da classe C , que cresce, consome, tem “trejeitos engraçados”, mas não falamos que é esta mesma classe C que está lá, na vida real, criando soluções. Faustini ressaltou: “Quem está fazendo moeda social? Quem está fazendo cultura no território? Quem está fazendo o mototáxi? É uma vanguarda que está na classe C.”  Celebremos esta vanguarda!

Meu desejo é que possamos olhar com mais interesse e respeito para estas histórias que estão acontecendo neste momento, em muitos lugares de um Brasil que pouco ou quase nada conhecemos. Que possamos nos inspirar a colocar em prática o que sabemos para participar dessa construção. Que consigamos compreender com estas iniciativas que a sustentabilidade na prática já está florescendo em diversos locais.  E que cidadãos como estes estão transformando realidades e dando outro significado à vida de milhares de pessoas.

*Raquel Diniz Ezequiel faz parte do Coletivo Interser. Este artigo foi publicado originalmente no Mercado Ético